A seleção natural, o condicionamento
operante e as práticas culturais, são as principais contingências responsáveis
pelo desenvolvimento dos operantes verbais. Enquanto a seleção natural atua nos
aspectos filogenéticos da espécie humana, o condicionamento operante atua no
nível ontogenético. Já as práticas culturais dizem respeito à evolução da
cultura decorrente dos agrupamentos de indivíduos. Estas contingências atuam
sobre os organismos humanos de forma entrelaçada, fortalecendo, então, a
ocorrência do comportamento verbal (Passos, 2003).
A compreensão destes três níveis de influências, que atuam juntas, sobre os operantes verbais, contribui para o entendimento das relações que se estabelecem na comunidade verbal. Sendo assim, o atual ensaio tem como objetivo definir e caracterizar os principais operantes verbais e suas variáveis de controle.
A compreensão destes três níveis de influências, que atuam juntas, sobre os operantes verbais, contribui para o entendimento das relações que se estabelecem na comunidade verbal. Sendo assim, o atual ensaio tem como objetivo definir e caracterizar os principais operantes verbais e suas variáveis de controle.
O
Mando
Ordenar, suplicar, pedir, aconselhar ou advertir,
são comportamentos verbais que estão sobre controle de estados de privação ou
estimulação aversiva e, assim, especificam sua consequência. Nas palavras de
Skinner (1957), o mando é classificado como um operante verbal cuja característica
principal é especificar uma consequência e está sob controle de uma operação
estabelecedora (p. ex. privação, saciação ou estimulação aversiva).
As variáveis de controle do operante verbal mando
são as operações estabelecedoras ou motivadoras. Entende-se por operação
estabelecedora (OE) aquelas variáveis de controle cujas propriedades afetam um
organismo pela alteração momentânea da efetividade reforçadora ou punitiva de
um evento e também alteram momentaneamente os repertórios do organismo que já
foram reforçados ou punidos por esses eventos. Em outras palavras, OE são
condições que alteram o valor reforçador daqueles estímulos que já possuem propriedades
reforçadoras para o indivíduo, tanto em um nível incondicionado (filogenético)
quanto condicionado (ontogenético).
As OE podem ser de três tipos, a contar: (1) As condicionadas
substitutas (OECS), que são caracterizadas por situações em que um evento
neutro, que antecede uma operação estabelecedora incondicionada, passa a ter as
características motivacionais desta; (2) as operações estabelecedoras
condicionadas reflexivas (OECR), que envolvem relações entre estímulos antecedentes
e estímulos aversivos, em que um estímulo que precede uma estimulação aversiva,
quando apresentado sozinho passa a estabelecer uma condição para a emissão de
qualquer resposta que remova o estímulo aversivo; (3) as operações
estabelecedoras condicionadas transitivas (OECT), que se referem às situações
nas quais a efetividade reforçadora de um estímulo condicionado depende do
contexto no qual este reforçador condicionado foi estabelecido. Atualmente, o
termo operação motivadora é usado, pois contempla as operações estabelecedoras
(OE) e as operações abolidoras (OA), que são aqueles eventos que diminuem a
efetividade de uma dada consequência.
Para entendermos um episódio verbal de mando sob
controle de operações estabelecedoras ou motivadoras, segue abaixo um exemplo na
figura 1:
Observa-se que um indivíduo cansado e com sono,
possivelmente em um contexto em que está deitado em sua cama e a luz de ser
quarto está acesa, ordena que uma pessoa (ouvinte) apague a luz. Ao ter a luz
apagada o falante pode então descansar e dormir, pois irá “saciar” seu sono e
eliminar uma estimulação aversiva, no caso, a luz. Neste exemplo há uma OE
(cansaço e privação de sono em um contexto para dormir) que faz da resposta
verbal “Apague a luz” um mando que especifica uma consequência (ter a luz
apagada).
Não existe somente um tipo de mando. Existem também
o mando prolongado, o mando supersticioso e o mando mágico. O mando prolongado
acontece quando mandamos em uma comunidade que não possui condições para nos
reforçar. Exemplos de mando prolongados acontecem quando damos ordens para
crianças muito pequenas, animais sem treinamento ou quando as próprias crianças
mandam nos brinquedos. Já o mando supersticioso se caracteriza por um reforço
acidental da resposta, como por exemplo: uma pessoa em uma festa de réveillon faz
pedidos para que o ano seja mais próspero. Se o ano desta pessoa foi próspero
ela poderá estabelecer uma relação entre seus pedidos e a prosperidade de seu
ano, mas esta relação é acidental. Quanto ao mando mágico, o falante pode criar
analogias com mandos antigos, mas há uma baixa probabilidade de reforço, pois
não há mediação do ouvinte, como por exemplo: uma pessoa em um engarrafamento
pode dizer “anda logo, transito!”, mas nada acontecer.
O
Comportamento Verbal sob o Controle de Estímulos Verbais
Para Skinner (1957), controle do
comportamento verbal por estímulo pode ser controlado por estímulos verbais e
não verbais. Para tanto, o autor busca tratar as respostas sob o controle de
estímulos verbais, escritos ou orais, proporcionados pelo próprio falante ou
por outra pessoa. Assim, as três principais categorias discutidas pelo autor
são: comportamento de repetição, textual e o intraverbal.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhUTapKU_cK-8OYtjookVjnjp-_AcvGwKMmFYqjPRh5qvLa_KtT49zjazW-S0QHa4MomPBRSjfdAnPDY3nI2Mbm2m8bLNZpi2wLHqoshSW5B1gM9G62gNp_0iyjrTmB1jVJjr-B18pyKDE/s1600/gato+lendoj4g.jpg)
Já o operante verbal textual caracteriza-se pelo
comportamento controlado pelo antecedente verbal de uma palavra escrita ou
impressa e a resposta é vocal. Neste caso, há entre o estímulo e a resposta uma
correspondência formal, arbitrariamente estabelecida. Ou seja, na presença da
palavra escrita “bolo” a pessoa lê a mesma palavra “bolo”. Um comportamento
textual está sob controle, ponto a ponto, de variáveis mínimas que chamamos de
letras. A diferença entre esse tipo de operante e de repetição, é que o textual
é produzido por um estímulo visual e não sonoro. Além disso, há também o
comportamento de transcrição em
que a resposta verbal escrita está sob controle de um estímulo antecedente
verbal, que pode ser vocal ou escrito. Bons exemplos do operante verbal
transcrição são as atividades de cópia e ditado realizadas principalmente pelas
crianças na escola.
O comportamento verbal intraverbal também
está sob controle total de estímulos verbais anteriores, sejam eles sonoros ou
visuais, mas a resposta não será correspondente ponto a ponto com o estímulo
anterior. Ou seja, após um estimulo verbal sonoro ou escrito “Qual é seu nome?”
o indivíduo pode responder de forma verbal ou escrita “José”.
Dentro
das comunidades verbais encontra-se intraverbais que foram aprendidos e estão
arraigados nos repertórios verbais das pessoas.
O
Tacto
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjAbIBoSjcaFv6CfNou-m5v4CvIK4cEOATKUdOLblEaAKz4EqWAK30jAIGETD-zrPoatXawZlqkEpX6VOO9oWpPAhl0njJHi43kPEEBCaRNxf_nhZUL7cizxrWO4O8ZFxdgHyFnfSCsD28/s1600/Gato+tatodes_1.jpg)
Em outras palavras, o tacto é um operante verbal cuja
resposta verbal é emitida sob controle de um estímulo antecedente específico
não verbal e produz como consequência o reforço generalizado. Para entendermos
um episódio de tacto, segue abaixo um exemplo na figura 2:
No exemplo acima, um estímulo discriminativo não
verbal sinalizou que a resposta “Está chovendo!” seria reforçada. Neste
exemplo, o tacto que é controlado por um estimulo discriminativo não-verbal,
cuja consequência é o reforço generalizado, é chamado de tacto puro. Porém, um
tato pode ficar sob controle de uma operação estabeledora, neste caso também é
um mando e é chamado de tacto impuro (Skinner, 1957).
A habilidade de tatear em uma comunidade verbal é
importante para que os indivíduos não só entrem em contato com o mundo físico,
mas também com o mundo interno, dentro da pele, deles mesmos e, em com alguns
limites, de outras pessoas. Desta forma, os ouvintes podem ter acesso, mesmo
que limitado, ao mundo do falante. Além disso, o tato permite que a comunidade
verbal entre em contato, por meio do comportamento verbal do falante, com vários
aspectos da cultura na qual o falante está inserido.
Condições
que Afetam o Controle de Estímulos
Na segunda parte do Verbal Behavior,
Skinner (1957) listou e exemplificou os principais operantes verbais, a contar:
o mando, o tato, a repetição, a transcrição, o textual e o intraverbal. No
capítulo seis, o autor preocupou-se em fazer um levantamento sobre os
determinantes e as influências sobre tais operantes verbais. O assunto,
portanto, diz respeito ao controle de
estímulos.
O capítulo seis aponta que a principal característica
do reforço generalizado nos episódios
verbais é a atenção. Ao verbalizarem, os indivíduos são capazes de
prender a atenção dos ouvintes. Em outras palavras, os indivíduos se
desenvolvem em um mundo onde as pessoas falam, escrevem, lêem, etc, e com isso
aprendem que para obter a atenção destas pessoas, precisam emitir
comportamentos semelhantes e com as mesmas propriedades funcionais. Ao tocar
outras pessoas por meio dos comportamentos verbais, os indivíduos podem receber
não só a atenção, mas também garantir outros reforços, como por exemplo,
dinheiro ou sexo em situações verbais de trabalho ou de conquista amorosa.
Por conta das relações funcionais em que os reforços
generalizados mantêm os comportamentos verbais, um falante pode apresentar
verbalizações distorcidas. Um exemplo deste fenômeno é o tato distorcido, que é
uma forma de contracontrole verbal a algum controle aversivo; como no caso das
pessoas que mentem para não serem punidas.
Outra condição que afeta os episódios verbais é a
punição. Skinner (1957) aponta que a punição do comportamento verbal pode ser
de várias formas, como por exemplo: a desaprovação, suspensão de privilégios e
até mesmo o silêncio. Para o autor, os efeitos da punição sobre o comportamento
verbal podem indicar uma generalização em que se uma resposta for punida, o
efeito se generalizará sobre respostas similares ou sobre respostas dadas em
circunstâncias semelhantes. Se a atenção é o principal reforço generalizado nos
episódios verbais, então,
possivelmente, para punir um comportamento verbal não é preciso usar de
agressões físicas ou verbais. Para tanto, basta não dar atenção ou ignorar a
pessoa que emitiu uma verbalização inadequada. Nesse sentido, ao
contrário de agredir, falar mal ou gritar (punição positiva), a punição negativa
pode ser eficiente, pois parar de dar atenção às pessoas costuma ter efeito
punitivo mais amplo e menos danoso.
Uma questão importante apresentada neste capítulo é que
o falante e ouvinte podem ser a mesma pessoa, como no caso da leitura em que o
leitor pode reagir ao seu próprio comportamento textual como ouvinte. Esta
condição ajuda a compreender o comportamento de pensar como um contato social
que o indivíduo faz com ele mesmo.
A
Audiência
Uma outra condição especial do
controle de estímulos é a audiência. As pessoas falam, escrevem, sinalizam,
etc, porque há outras pessoas que as ouvem, lêem, compreendem, etc. Até mesmo
quando falamos sozinhos, há um ouvinte: nós mesmos. Assim, um ouvinte como
audiência tem funções múltiplas: ser estímulo discriminativo e provedor de
reforçadores. A audiência será então um estímulo discriminativo na presença do
qual o comportamento verbal é caracteristicamente reforçado e diferentes
audiências controlam diferentes subdivisões do repertório do falante. A audiência aparece sempre entre as condições
antecedentes relacionadas com a emissão da resposta que constitui determinado
operante verbal.
A
audiência pode ser positiva ou negativa. Será positiva quando especificar uma
condição para que o comportamento verbal seja reforçado, e será negativa quando
apontar uma condição na qual o comportamento verbal não será reforçado ou será
punido. Neste sentido, se alguém tentar conversar sobre novelas com outra
pessoa que não gosta e não assiste novela, seu comportamento verbal não será
reforçado, pois aquele que não gosta de novelas não será uma audiência adequada
para o comportamento de falar sobre novelas.
O Operante Verbal como Unidade de Análise
Neste
capítulo há um breve resumo sobre os seis tipos de relações funcionais existentes
nos episódios verbais, a contar: (1) no mando,
uma forma de resposta controlada por estados de privação ou estimulação
aversiva produzirá um reforço específico; (2) nos comportamentos ecóico, textual e intraverbal a resposta é determinada
por um estímulo verbal anterior, que pode ser sonoro, escrito ou ambos, e o
reforço será generalizado; (3) no tacto,
o estímulo que controla a forma de resposta costuma ser não-verbal e há
generalização do reforço e a (4) a audiência é um estímulo anterior, usualmente não-verbal, que controla
grupos de respostas (Skinner, 1957).
O
interesse nesta revisão para fechar a unidade concernente às variáveis de
controle é para discutir as unidades de análises presentes no comportamento
verbal. São os operantes verbais, com suas propriedades funcionais e
contextuais, as unidades mínimas para esta análise. Portanto, os estudos dos
comportamentos verbais feitos por meio da linguística ou da gramática são
excluídos da abordagem funcionalista e contextualista, pois estes estudos
poderiam considerar as palavras, frases, letras, sons, etc, como as unidades
mínimas do comportamento verbal.
Considerações Finais
Todos os operantes verbais aqui descritos possuem propriedades singulares, mas atuam de forma entrelaçada em episódios verbais complexos, como por exemplo, aqueles que envolvem descrição de sentimentos. Assim, um analista do comportamento pode atentar-se não só para a relação experiencial que um indivíduo estabelece com seu mundo físico, mas também com seu mundo privado.
Além disso, Skinner mostra que o estudo do comportamento verbal contribui para o entendimento do como a cultura de desenvolve e as razões pelas quais as comunidades verbais reforçam ou punem certas verbalizações. Em outras palavras, podemos dizer que para o bem ou para o mal é a comunidade verbal a raiz das práticas culturais dos humanos.
Além disso, Skinner mostra que o estudo do comportamento verbal contribui para o entendimento do como a cultura de desenvolve e as razões pelas quais as comunidades verbais reforçam ou punem certas verbalizações. Em outras palavras, podemos dizer que para o bem ou para o mal é a comunidade verbal a raiz das práticas culturais dos humanos.
Referências
Passos, M. L. R.
F. (2003). A análise funcional do comportamento verbal em Verbal Behavior
(1957) de B. F. Skinner. Revista
Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva, 2(V), 195-213.
Skinner, B. F. (1957). Verbal Behavior. Cambridge, Massachusetts: B. F. Skinner Foudation.
* Texto desenvolvido a partir do aprendizado na disciplina Comportamento Verbal do Programa de Pós-Graduação em Ciências do Comportamento da UNB.